Hoje fui fazer a prova do Processo de Promoção por Mérito para os professores da rede estadual de São Paulo.
Confesso que fiz a prova com uma tristeza muito grande, sentindo vergonha de estar participando de uma coisa que não acredito. Mas assim o fiz por que também me imaginei sem fazer, vendo outras pessoas terem seus salários aumentados em 25%, um pouco mais digno e mais próximo de uma salário decente. Nada mais justo para quem passa o ano letivo se descabelando, correndo atrás de atividades que melhor estimulem o desenvolvimento dos alunos, gastando tinta da impressora imprimindo-as, ou usando seu próprio dinheiro para reproduzí-las. Sofrendo com aqueles que por algum motivo não avançam e, ainda mais, quando conhece um pouco de suas histórias de vida, carentes de tudo.
Nem precisaria assistir às tristes imagens do Haiti.
As vezes fico tão sensibilizada que tenho vontade de adotar alguns deles e cercá-los de tudo que acho necessário para a formação de, mais do que de um trabalhor criativo, resiliente, pró-ativo, autônomo, como alguns preferem, uma pessoa feliz, segura de sua identidade, que saiba compreender os outros e que consiga ler nas entrelinhas da vida, a riqueza de se relacionar com outras pessoas. Conhecer é mágico, humaniza. Mas de que vale o conhecimento se ele não trouxer a felicidade, a vontade de se relacionar com os outros de maneira saudável, pacífica, solidária, humanizante?
Esta questão pouco é trabalhada em nossas escolas e a mim parece fundamental. Para que conhecer?
Hoje porém não havia nenhuma questão sobre o "para que conhecer?". Ou outras tão importantes quanto, "para que escola?", "que escolas queremos?".
Não, para algumas pessoas são questões inúteis. Interessa é saber se aquilo que alguns educadores acreditam como sendo o melhor método e a melhor metodologia de ensino, aceitas e defendidas pelo Estado, foram assimiladas pelos professores, mesmo que não se acreditem muito nelas. Aliás, nem sequer é necessário que aquela prática da alternativa na qual você marcou um "xis" seja realmente uma prática sua. É só ser cínico ou cínica o bastante e um pouco inteligente para, conhecendo aquilo que os avaliadores querem constatar e assim o fazer.
Ao invés da solidariedade, da humanização, a concorrência, a disputa, a busca pelos resultados (que são apenas números para quem tá no alto escalão das políticas públicas). O rankiamento que desmobiliza, desagrega, desestimula, desmotiva, deprimi, corrói.
Mesmo no meio empresarial (de onde são retiradas as grandes idéias administrativas que visam a qualidade de serviços e produtos), empresas sérias, do meio corporativo, sabem o quanto a discrepância salarial entre funcionários de mesmo cargo podem causar na auta estima dos mesmos, nas relações entre pares e o estrago que estes podem provocar na chamada produtividade.
O São Paulo Futebol Clube, por exemplo, conhecido por ser um time estável, regular, o grande ganhador de campeonatos brasileiros, se não é, sempre está no rol dos cinco melhores, time de auta produtividade, assim o é, pois tem uma administração séria, coerente que, dentre outras coisas, se recusa a contratar jogadores com salários muito mais altos que do restante do time. Para não ruir o que conquistou até agora.
Aí me lembro que o aumento de 25% no salário, um aumento considerável, que poderia sim causar impacto na educação no Estado, será benefício de apenas 20% dos professores que prestaram a prova hoje, em todo Estado. Parece o número razoável, se não fossem os 80% restante, que ficarão com o salário 25% menor que de seu colega da sala ao lado, que trabalha o mesmo tempo, as vezes é menos experiente, as vezes usa o cargo público como segundo emprego e por isso não se dedica tanto, mas conhece as regras do jogo e é esperto o suficiente pra passar numa prova que nem de longe avalia outros fatores fundamentais na escola dita de qualidade (alguém sabe me dizer que qualidade é essa?) como dedicação, perseverança, solidariedade, respeito, ética, responsabilidade, compromisso, paciência.
Alguns colegas vão discordar de mim. Mas estes e nós outros, no final, somos só números. Professores, alunos, escolas... só números.
Tenho a impressão que a batalha pela escola pública de qualidade será eterna. Ao ler seu post,fiquei pensando: Como detectar os colegas que conhecem as regras do jogo? Ou melhor, como detectar na "prova" que o cara apenas aprendeu as regras do jogo? (se descobrir me conte...)
ResponderExcluirSeu post é pertinente, é o que você pensa sobre o que acontece na educação pública. Mas o bacana é que você tem clareza do trabalho que faz com seus alunos, pode parecer pouco, mas esse pouco é o que faz a diferença frente a educação. Todos os alunos que passarem por você nunca mais serão os mesmos. E isso não é qualquer coisa!!
Não deixe que a acomodação contamine seu trabalho, só assim você não será só número. Aliás, você não é só número, caso contrário não teria apresentado um post ético ao falar de tantos problemas...
Eu entendi o que vc escreveu Débora. Fiquei com medo de ser injusta ao escrever dessa forma mas assim o fiz para mostrar o que penso sobre esta prova... que ela é só uma prova. Não é capaz de avaliar realmente os professores que merecem ou não serem bem remunerados. Conheço várias professoras execelentes que talvez não se saiam tão bem na prova por vários motivos, um deles é que, por não serem de uma geração de cultura avaliativa, talvez possam sair em desvantagem na "corrida pelos 25%". Posso estar sendo precipitada. Espero realmente que sim. Obrigada por me acompanhar. Bjos.
ResponderExcluirPS.: Perdoe-me pelas possíveis ironias ou sarcasmos. Uso quando estou muito incomodada com alguma coisa. Não tenho a intenção de ser prepotente, arrogante. Respeito a opinião alheia, quando se realmente acredita nela. Admiro muito sua paixão pela educação. Ela é latente. Verdadeira.
Bom, futuramente, se Deus quiser, estarei tendo as mesmas dores de cabeça que você(rs). Resta você me preparar pra esse tipo de coisa, pois não acho difícil eu pensar igual a você, tendo em vista o óbvio que nos faz pensar igual, a nossa educação. Infelizmente as coisas funcionam assim, mas se é possível pensar, acredito que isso mudará no futuro. Vai depender de professores assim como você e muitos outros que pensam igual. Tenho muito a aprender sobre tudo isso, mas acredito não querer fazer parte de uma minoria que não sabe qual é o verdadeiro valor da educação.
ResponderExcluirBeijos, amo. Até daqui a pouco aí em Sampa.
Fico muito feliz em saber q conheci uma pessoa tão especial como vc Cla, que compartilha dos mesmos sentimentos q eu em relação as atrocidades q esse governo vem fazendo com a educação pública no nosso estado. E posiciono-me muito alegre pelo seguinte fator: É maravilhoso, saber q ainda há professoras com esse encantamento q lhe é característico...uffa!! q bom!! sorte dessas crianças! Pena que o nosso governador e nosso secretário da educação ñ contemplem sua dedicação e seu empenho em batalhar pela transformação da sociedade em que vivemos!!
ResponderExcluirbjks no seu coração!!!!